Eu ainda me lembro: era uma noite fria, com muita chuva, raios e trovões. Minhas irmãs, meus irmãos e eu estávamos com muito medo, e nos agarramos às tetas de nossa mãe, e estremecíamos a cada trovão. De repente, duas mãos enormes agarraram a mim e a minhas irmãs e nos colocaram numa caixa de papelão, e nos abandonaram a beira de uma estrada. Gritamos o resto da noite por nossa mãe. Com muito medo e fome – éramos bebês com menos de um mês – nos agarramos uns aos outros e conseguimos dormir um pouco. Amanheceu, e acordamos molhados, com frio e fome, e começamos a gritar, e gritar muito. Várias pessoas ao passar, nos espiavam, e diziam: Oh! Coitadinhos! Que bichinhos feios, e abandonados! Ninguém vai querer adotar! Que orelhas tão grandes, parecem filho de rato ou de morcego.
Mas com o passar das horas alguém levou uma irmãzinha. Depois outra. Um pouco depois, mais um irmãozinho, e outra, e outro... e eu fiquei ali só... sozinha, sem ninguém, com fome, frio e medo!!
Horas depois chegou alguém da ONG Viva Bicho e me disse: “Vamos arrumar um lar para você, bichinho.” Me pegou no colo e me levou até uma casa e perguntou se a dona da casa queria me adotar, mas ela respondeu: “Não quero mais cachorro... dá muito trabalho”. Mas a moça insistiu: “Por favor, senhora, essa cachorrinha é muito bebezinho, fique com ela até encontrarmos uma família para adotá-la.” Então, a dona olhou para a minha carinha, e me pegou no colo... hummm ... até hoje lembro do calor e do cheirinho bom que senti.
Ela preparou uma caminha para mim na casinha de seu cão, que havia morrido bem velhinho, à poucos meses atrás. Ela me deu comida e água, entrou em casa e fechou a porta.
Foi então que eu pensei: tenho que fazer alguma coisa... pois eu quero morara aqui e ganhar de novo aquele colo gostoso! E eu comecei a gritar com todas as minhas forças... gritei, gani, urrei e gemi... até que ela abriu a porta e disse: “Eu vou devolver esse bicho imediatamente!” Mas eu corri para ela, abanando meu rabão, e dei beijoquinhas em seus pés... Foi o suficiente! Ela me pegou no colo e me levou para dentro de casa. Minha casa!
Hoje, eu sou a dona da casa. Tenho meu sofá para dormir, mas gosto mesmo é de ficar no quarto da mamãe. Tenho água, comida e biscoitos, e minhas donas fazem todas as minhas vontades. Apesar de ainda sentir muito medo de trovoadas, eu sou muito feliz!!!